Língua Portuguesa Redação

A quem cabe o ensino de redação?

Imagine a seguinte situação: você sentiu uma dor lancinante no peito e achou necessário procurar um médico; afinal, poderia ser um sintoma de infarto, certo? Ao chegar ao consultório, descobriu que aquela pessoa não tinha habilitação profissional para lhe atender. Apesar de não ser da área, ela gostava muito de Medicina e, por isso, achou que seria capaz de dar consultas, prescrever medicação e, quem sabe, realizar umas cirurgias. Sabendo disso, você permaneceria no local ou iria embora? Se Medicina só deve ser exercida por médicos, por que você acha normal que alguém sem formação em Letras ensine redação ao seu filho ou a você?

Eu sei que essa comparação pode lhe parecer desproporcional, mas não é, não! É o médico (assim como o farmacêutico) quem tem a formação para saber se um medicamento pode ser tomado junto com outro; é ele quem sabe se aquela dor aguda é mesmo um infarto e não alguma outra patologia. A internet está cheia de gente que “gosta de língua portuguesa” e, por isso, considera-se capaz de ensinar redação, mas é o profissional de Letras quem sabe orientar ADEQUADAMENTE sobre a construção de um texto!

Na graduação em Letras, estudamos não apenas a gramática normativa da língua, mas também sua história e seus aspectos sociais. Entre outros tópicos, estudamos algo chamado Linguística do Texto, além das disciplinas da Licenciatura. Somos nós, profissionais de Letras (e não os outros), que temos a formação acadêmica para o ensino de língua e a produção textual nessa mesma língua. Simples assim!


Ensinar redação não é despejar sobre o estudante um amontoado de dicas ou de macetes bobos, catados em perfis de rede social.

Também não é replicar uma fórmula equivocada sobre a quantidade de linhas e parágrafos que um texto dissertativo-argumentativo deve ter. Anos atrás, um aluno procurou-me para relatar os pontos perdidos em outra disciplina, por ter escrito um parágrafo com mais de cinco linhas. Na época, eu era coordenadora e procurei a colega, a fim de entender esse estranho critério de correção. Lembro de ter perguntado com base em qual fundamentação teórica, ela (docente de outra disciplina) havia tomado aquela atitude. Sua resposta foi: “Mas eu sempre OUVI FALAR que parágrafo não pode ter mais de cinco linhas”. Um profissional de Letras não ensina com base em “ouvi falar”. E, não, não existe número certo de linhas em um parágrafo! Eu escrevi sobre isso no texto 6 mitos sobre a redação no ENEM.

O que me inspirou para a escrita deste texto foi uma provocação feita pelo professor Wendell Gustavo em seu perfil no Instagram. No post publicado em 06 de janeiro, o professor é muito objetivo ao declarar: “Verdade seja dita! Professor de redação é quem CURSOU LETRAS!”. E eu concordo!

Para conferir o texto do professor Wendell, CLIQUE AQUI.

5 Comments

  1. Discordo, e achei o exemplo do texto desproporcional. A comparação é justa para entendermos o que você quer propor aos seus leitores. Contudo, não convém comparar um profissional que constantemente está em contato com a vida e a morte de um paciente. Eu mesmo não tenho formação em música e já dei aulas básicas de violão. A questão é somente saber o seu lugar. Caso o aluno queira aulas mais aprofundadas de redação, realmente, tem que ser alguém entendido (com formação) no assunto. Mas, caso ele queira aprender a fazer uma redação do padrão do Enem, acho justo um aluno que já tenha tirado uma nota exemplar cobrar para ensinar os outros sobre este aspecto, “redação do Enem”.

    Enfim, sou admirador do seu trabalho, mas discordo do que foi relatado aqui e a ênfase sobre esse assunto. Ao menos, não concordo do jeito que foi tratado em seu texto.

    1. Oi, Lucas! Seus comentários são sempre muito produtivos.
      Um aluno “que já tirou uma nota exemplar” ensinará a fazer uma redação com base apenas na sua experiência. O profissional de Letras tem a seu favor toda a sua formação e, muitas vezes, o conhecimento sobre os critérios da banca, que o aluno curioso não vai achar no Google.

  2. Estou em êxtase com esse texto. Fico feliz que você tenha se inspirado em mim, prof. Sigamos lado a lado em busca do nosso lugar por direito: a docência em redação.

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Andréa Motta

Professora de Língua Portuguesa , Literatura e Formação do Leitor Literário no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro.

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