Li na placa será a nova coluna semanal do blog, publicada a partir hoje, 25/04, sempre aos sábados. A proposta desse novo projeto será comentar textos exibidos em placas do comércio, escritas com algum tipo de desvio gramatical. Quem tem perfil em rede social sabe que elas são muito compartilhadas e o propósito é só fazer piada sobre os “erros de português”. Meus ex-alunos, com certeza, lembrarão do quanto eu fico irritada com publicações e falas cujo objetivo é ridicularizar o modo de escrever ou falar das outras pessoas.
A ideia para a coluna surgiu de uma situação real vivida por mim em uma fila de supermercado: a placa, equivocadamente escrita, provocou uma série de risos e deboches. Aquilo me deixou muito desconfortável e eu, como professora de língua portuguesa, comecei a pensar na lógica linguística que havia provocado tal escrita.
A placa – I
A explicação
A escrita correta é HIGIENIZADOS, pois não recebem acento gráfico as palavras oxítonas ─ em que a tonicidade incide sobre a última sílaba ─ terminadas em -o, seguidas ou não da desinência de número.
Na grafia equivocada do cartaz, ocorre uma analogia com HIGIÊNICO, palavra proparoxítona (acento tônico na antepenúltima sílaba), derivada de higiene.
A placa – II
Outra imagem muito compartilhada nas redes sociais é essa com os dizeres “Fui ao mossar”.
A explicação
Não sabemos se o redator do aviso escreveu daquela forma por desconhecer as convenções da língua ou apenas como uma brincadeira, mas ele o fez com base em hipóteses linguísticas corretas. Como assim?
Você já reparou em como crianças pequenas conjugam o verbo fazer no pretérito perfeito? Não é incomum ouvirmos “eu fizi” ou “eu fazi”. É uma hipótese linguística: se o verbo é fazer, o correto (pensa a criança) deve ser fazi ou fizi. As crianças pequenas, que ainda não começaram os estudos linguísticos na escola, desconhecem o conceito de regularidade verbal; conjugam o verbo, portanto, com base em hipóteses!
Qualquer pessoa minimamente alfabetizada consegue reconhecer a frase “Fui almoçar” na imagem acima. Embora a ortografia tenha razões históricas (como a etimologia e a fonética), ela pode mudar! É bom que esclareçamos um aspecto óbvio dos estudos linguísticos: ortografia não é gramática; é uma convenção!
A ortografia pode ser estabelecida até por meio de acordos internacionais e eu escrevi sobre isso em 2015 no texto “Você está pronto para a nova ortografia?“. Antes do Acordo Ortográfico (assinado pelos países lusófonos em 1990 e em vigor, em todos eles, desde 2016), escrevia-se idéia, anti-social e microondas; hoje, escrevemos ideia, antissocial e micro-ondas.
Seja lá qual for a razão que motivou a escrita “fui ao mossar”, o som é exatamente o mesmo de “Fui almoçar” e é daí que vem o humor da placa.
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Gostei muito! Sou apaixonado por essas questões e pela língua portuguesa, embora sempre tenha sido um péssimo aluno e ainda erro muito ao escrever (principalmente z/s, ç/ss, u/l, u/o). Em “Almoçar” minha dúvida, talvez, seria no l/u/o. Ainda bem que hoje tem corretor ortográfico e o celular, onde eu posso, na maioria das vezes, pesquisar a grafia correta antes de escrever. Também, acho que, além de trocar as letras, como eu costumo fazer, esqueceram de colocar o hífen na separação da sílaba “ao” do restante da palavra… Ou, ainda, quem sabe, “MOSSAR” seja alguém ou algum lugar ali na empresa… Vai saber…