Autor convidado Educação ENEM

ENEM em tempos de pandemia: uma análise do discurso governamental

“ Estamos enfrentando a mesma tempestade…mas não estamos no mesmo barco.”

Essa frase tem me acompanhado muito nesse período de pandemia mundial que estamos enfrentando. Muito. E em diversos aspectos; seja emocional, social, político, entre outros. Mas, deparando-me com a chamada do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e o Ministério da Educação, deparei-me com a realidade do aspecto social que Educação Brasileira atravessa nesse momento. Não somente pela questão dos candidatos ao maior vestibular do país…mas…em como o discurso que o atual governo trata em si algo tão caro a todos nós… (ou assim deveria ser).

Como uma admiradora da Análise do Discurso, penso que há muitas maneiras de significar a “palavra em curso”: o sentido percebido é notoriamente o da exclusão. Sim, exatamente, pois num país com dimensões tão continentais como o nosso, e na realidade dessa grande crise sanitária que assola não só o Brasil como todo o mundo, notoriamente é dado lugar de fala àqueles que, neste momento, são os “propriamente dignos” de ao menos tentarem ingressar nas universidades federais, deixando para trás tantos outros brasileiros que poderiam de fato ocupar “ as gerações de profissionais” que, como cita a chamada, serão desperdiçados no futuro. E perceber que a educação tem esse caráter excludente, vindo de quem deveria proporcioná-la com maior equidade…é completamente frustrante. Acredito, de fato, que é o que mais machuca, principalmente quando se acredita tanto nela, é constatar esse fato. E principalmente no grande apoio que essa fala tem de muitos brasileiros também.

Como afirma M. Pecheux , “não há discurso sem sujeito e não há sujeito sem ideologia: o indivíduo é interpelado em sujeito pela ideologia e é assim que a língua faz sentido” (ORLANDI, 2007), fica nítida a relação de todo o sentido que atual propaganda carrega no tocante de quem merece o “ futuro que está logo aí”.  Para que perceber  a realidade em que os estudantes da rede publica estão enfrentando?  A nova realidade na qual fomos obrigados a forçosamente nos adaptar (ou não) da educação online apontou (e fez disparar) mais ainda a desigualdade a que tantos estão vivendo. É o discurso vai produzindo sentido…mas…quem se importa com os “excluídos”? E daí, não é mesmo?

Existem muitos outros pontos que podemos trazer à luz da reflexão com base apenas nessa propaganda. Tantos. Por ora, me entristeço. O que ouvi naquela somatória de frases “Estude de qualquer jeito, a vida não pode parar”  é carregado de simbolismos do discurso separatista da ideologia apresentada pelo pensamento adotado do atual governo do nosso pais. E hoje, minha luta é saber que esse não é o sentido que desejo para a minha juventude. A gente pode e deve se reinventar sim, mas de mãos dadas, entendendo que a educação, de verdade e igualitária, pode sim mudar o tão dito futuro do país.  “Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda”, como já dizia nosso amado Paulo Freire.

Referência:

ORLANDI, Eni P. Análise do discurso: princípios e procedimentos. 7. ed. Campinas: Pontes, 2007.


Joseane Ribeiro é graduada em Língua Portuguesa e suas Literaturas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Atua como professora voluntária no Pré-vestibular Comunitário da Paróquia Cristo Rei . No Conversa de Português, ela já publicou os texto Leitura e sentido e A leitura nossa de cada dia.


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"Autor convidado" é uma coluna do blog, em que são publicados textos enviados por convidados da professora Andréa Motta.

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