“Professora, a senhora vai dar aula de interpretação de texto ou vai ser só na aula de Literatura?”: eu ouvi essa pergunta de uma aluna dias atrás e lhe respondi que não existe leitura sem interpretação, que nós acabáramos de compreender e interpretar os textos selecionados para a aula de língua portuguesa. Não foi a primeira vez que um aluno veio com essa indagação e eu me pergunto: “O que, afinal, é interpretação de texto?”
Como eu já escrevi no texto 5 estratégias de leitura que podem ajudar você nos estudos, interpretar um texto não é opinar sobre ele, nem adivinhar o que o autor quis dizer!”. É muito comum os estudantes dizerem que fizeram a interpretação de determinado trecho e o “professor não concordou com a opinião”. Repito: Interpretação não tem nada a ver com opinião!
Luiz Antônio Marcuschi (2008) aborda o tema e afirma que “ler e compreender são equivalentes” (p. 239); assim também, não haveria distinção entre ler, compreender e interpretar:
Ler e compreender são equivalentes. [Suponha-se que alguém diga “Li todo o livro e não entendi nada”. Neste caso, é razoável perguntar-se se ele leu o livro, ou pelo menos seria interessante indagar-se sobre o que se entende com ler no caso de uma expressão como essa. Em suma: ler equivale a ler compreensivamente. Portanto, recitar de cor um texto não é garantia de tê-lo compreendido. Memorizar não é o mesmo que compreender].
[…]
Compreender é partir dos conhecimentos (informações) trazidos pelo texto e dos conhecimentos pessoais (chamados de conhecimentos enciclopédicos) para produzir (inferir) um sentido como produto da nossa leitura. Compreender um texto é realizar inferências a partir das informações dadas no texto e situadas em contextos mais amplos. (MARCUSCHI, 2008, p. 239)
No processo de compreensão de textos, um conjunto de conhecimentos prévios é utilizado: linguísticos, enciclopédicos, pessoais, institucionais, sociais e culturais. Em concursos públicos e, obviamente, na rotina de sala de aula, é bastante comum que o estudante encontre no programa algum tópico relacionado a leitura e interpretação de textos. Não é exclusividade da escola, nem do concurso público. Nós fazemos isso a todo instante e é, por isso, que fico tão incomodada quando vejo títulos como “Interpretação para concursos”. No ENEM, por exemplo, o edital é bastante claro quanto ao esperado do aluno:
Competência de área 5 – Analisar, interpretar e aplicar recursos expressivos das linguagens, relacionando textos com seus contextos, mediante a natureza, função, organização, estrutura das manifestações, de acordo com as condições de produção e recepção.
H15 – Estabelecer relações entre o texto literário e o momento de sua produção, situando aspectos do contexto histórico, social e político.
H16 – Relacionar informações sobre concepções artísticas e procedimentos de construção do texto literário.
H17 – Reconhecer a presença de valores sociais e humanos atualizáveis e permanentes no patrimônio literário nacional.
Na vida, na sala de aula, no ENEM, somos todos avaliados quanto à nossa capacidade leitora: somos capazes de compreender as ideias explícitas e interpretar os sentidos implícitos dos textos? Algumas pistas podem nos ajudar a perceber que nível de compreensão é esperado do leitor em determinada questão. Somos capazes de compreender as ideias explícitas (aquilo que está escrito) e inferir os sentidos implícitos dos textos (o que está sugerido)?
Como perceber se a questão exige compreensão das ideias explícitas ou das implícitas?
Comandos para compreensão de ideias explícitas | Comandos para compreensão de ideias implícitas |
Segundo o texto…
O autor afirma que… O texto mostra que… De acordo com o texto… | O autor sugere que…
Pode-se inferir das ideias do texto… Depreende-se das estruturas linguísticas do texto… Subentende-se do texto que… |
Tabela adaptada de GranCursos On line. Veja material completo AQUI. (Arquivo em PDF).
Leia mais no blog:
5 estratégias de leitura que podem ajudar você nos estudos
Referência:
MARCUSCHI, L.A. Produção textual, análise de gêneros e compreensão. São Paulo: Parábola Editorial, 2008
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Todos nos devemos ter em mente que interpretamos textos o tempo todo. Textos verbais, não verbais, escritos ou não. Interpretamos olhares, gestos e maneios . Não podemos culpar a escola e muito menos os professores por essa deficiência que muitos carregam consigo é chegam à faculdade com essa deficiência por pura preguiça mental de raciocinar sobre o que leu. Uma boa leitura tem que ser cuidadosa procurando entender as entrelinhas observar as conjunções, pontuações e ver as palavras no contexto em que estão sendo usadas pelo produtor do texto.
Bom tô me alongando demais não sou professor de português, então, posso tá escrevendo besteiras aqui. Peço a compreensão de quem ler o que, aqui, escrevi.
Não há problema em se alongar demais. Eu preciso discordar de um ponto em seu comentário: “preguiça mental de raciocinar sobre o que leu”. Sim, a escola tem sua parcela de responsabilidade nisso e os relatórios da Unesco e outros órgãos apontam que o estudante brasileiro chega ao Ensino Médio sem saber ler. Leitura aqui entendida não como decodificação de símbolos, mas no sentido em que eu apresentei no texto: a compreensão textual.
Se o estudante é acostumado a fazer provinha de livro em que as perguntas são superficiais (“Quem é o personagem?”, “Quem falou o que pra quem?”), como ele aprenderá a perceber as entrelinhas? Isso também deve ser ensinado, isso também pode ser aprendido. Contudo, essa relação de ensino/aprendizagem da leitura passa por uma outra esfera, a formação docente. Para ensinar esse nível de leitura, o professor precisa ser, antes de tudo, um leitor competente: não se oferece o que não se tem.