Há alguns meses, eu propus à minha turma de Oficina Literária I, cuja ementa contempla os estudos sobre literatura infantil e juvenil, a leitura de dois textos: Educação contra a barbárie, de Theodor Adorno, e Infância, cultura contemporânea e educação contra a barbárie, de Sônia Kramer. No primeiro texto, o autor afirma que “desbarbarizar tornou-se a questão mais urgente da educação de hoje em dia” (ADORNO, 1995, p.156); no segundo, a autora indaga como garantir que as crianças tenham os direitos de cidadania respeitados, como evitar que sejam desumanizados. Adorno referia-se às crianças educadas após o terror em Auschwitz; Kramer, às crianças do final do século XX. No dia seguinte à leitura dos textos, o jovem Wellington invadiu uma escola em Realengo, no Rio de Janeiro, e atirou em alunos e professores. Ontem, dia 22 de setembro, um menino de 10 anos tentou matar sua professora e, em seguida, matou-se atirando contra a própria cabeça.
O que leva dois jovens a atos tão violentos quanto os de Wellington e o de David Nogueira? O primeiro tinha fixação por jogos de guerra, acreditava-se mensageiro de Deus em um mundo de perversões (como deixou escrito em uma espécie de carta suicida); o segundo tinha 10 anos, era descrito como “criança calma” (como acabou de dizer uma de suas professoras na TV), o pai era guarda civil na cidade de São Caetano do Sul (SP). Ninguém sabe explicar as atitudes de ambos.
Eu tento entender por que essas crises convergem para a escola. Nós, brasileiros, não estamos acostumados a ver e ler notícias assim; elas só nos chegavam pela TV como um fato distante, coisa de filme “baseado em fatos reais” vindos de alguma escola americana. Até aqui a nossa barbárie educacional tinha outra característica e nem sempre aparecia na imprensa para nos chocar: há centenas de relatos de professores agredidos física e moralmente por alunos, mas até agora nenhum fora morto. E, agora, o que falta acontecer?
Referências
ADORNO, T.W. Educação contra a barbárie. Educação e emancipação. São Paulo: Paz e Terra, 1995. p. 155-168.
BAZÍLIO, L. C.; KRAMER, S. Infância, Educação e Direitos Humanos. 2.ed. São Paulo: Cortez,2006.