Todas as vezes em que eu analiso as estatísticas de acesso do blog, eu encontro a mesma palavra no topo da lista de termos de busca que trazem leitores ao Conversa de Português: uso da crase. O texto mais acessado no CP é Ir à praia ou ir a praia: o uso do acento grave, publicado em 2009, embora haja outros sobre o mesmo assunto. Por essa razão, decidi redigir um novo texto com as melhores dicas daqueles publicados anteriormente e preparei um bônus para você!
1. Crase não é o nome do acento
Quem é profissional de Letras ouve sempre a indagação: “Tem crase ou não tem crase?”.Crase não é o nome do acento, mas sim o nome do fenômeno fonético que ocorre devido à contração de duas vogais idênticas. Na língua portuguesa, tal fenômeno é indicado graficamente pelo acento grave ( ` ).
Também não é adequada a frase “Quando usar a crase ou não”. Se o equívoco começa na elaboração da pergunta ou da afirmação, isso demonstra que o conceito não foi bem compreendido e nos leva a uma série de questionamentos: se os livros didáticos voltados ao Ensino Fundamental e ao Ensino Médio contêm capítulos sobre isso, por que os alunos não aprendem? Se esses mesmos alunos passam a vida escolar decorando regras sobre a crase, por que não aprendem? A resposta é óbvia: 1. compreensão de fenômenos linguísticos e memorização de regras não são sinônimos; 2. “decoreba” não é uma estratégia eficaz para o aprendizado de línguas.
2. Como identificar a necessidade de usar o acento grave?
A crase é uma questão de morfossintaxe. Assim, na sequência “Vou à escola”, ocorre crase, porque houve a contração de dois “a”, o primeiro exigido pelo verbo vou (a regência é ir A; ir A algum lugar). O segundo “a” se refere à palavra escola, que admite o artigo definido feminino a. Se não houvesse a crase, a frase ficaria assim: “Vou aa escola.”
IMPORTANTE: Cabe aqui um aviso que parece desnecessário: ao ler “à” não se deve dizer “aa”, o que seria uma contradição, uma vez que a forma representa uma fusão.
Um dos recursos mais utilizados é a troca de preposição: A preposição A relaciona-se com as preposições para, de, em, por. Neste caso, pode-se tentar trocar a preposição por uma destas outras. Se desta troca resultar as formas para a, da, na, pela, o A pode ser acentuado.
Fiz uma excursão para Brasília – Fiz uma excursão a Brasília (Compare com Volto de Brasília e note que temos apenas a preposição de.)
3. Há casos em que ocorre crase também com palavras masculinas.
Uma regra exaustivamente repetida é aquela segundo a qual só ocorre crase “se a palavra que vier depois do verbo for feminina e admitir o artigo a“. Isso não é verdade!
Quando afirmamos que só ocorre crase antes de palavra feminina, estamos apenas fazendo referência ao caso mais frequente da crase (preposição “a” + artigo definido feminino “a”). Vamos recordar o que foi dito lá no início deste texto: “A crase é fenômeno fonético que ocorre devido à contração de duas vogais idênticas“. Por que, então, as frases do exemplo acima contêm crase?
Observemos a frase “Pediu um bife à Oswaldo Aranha.” Temos aqui uma sentença em que a palavra moda ficou implícita (“bife à moda / ao modo de Oswaldo Aranha). O mesmo acontece com as expressões “arroz à grega”, “bife à milanesa”. São casos em que a simples memorização de que “à é o encontro de a + a” não nos ajuda a compreender como aquele acento foi parar ali.
Analisemos também o segundo exemplo: “Dedicou-se àquele projeto”. O verbo dedicar-se exige, por sua regência, a presença da preposição A (dedicar-se a alguém, a alguma coisa). Sendo assim, se não houvesse o acento grave para representar uma contração, teríamos de escrever “Dedicou-se a aquele projeto”. Como a língua portuguesa resolveu essa questão estranha? Representou na escrita, por meio de um sinal, o que já existe foneticamente: àquele. Por essa razão, temos também as formas àqueles, àquilo, como podemos observar em “Dedicou-se àquilo que sempre quis.”
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Link para o arquivo atualizado em 10/07/2020.
Olá, gostaria de tirar uma dúvida… A frase: “Somos dedicados a simplificar o processo…” vai crase?
Gabriel, você conseguiu baixar o arquivo que eu disponibilizei no final do texto? Ali eu explico que não ocorre crase de verbos.
Andréa, você é sensacional! Que explicação maravilhosa! Sou professora de Língua Portuguesa, Literatura e Redação. Amei ver escrito o que eu sempre costumo falar com os meus alunos. Parabéns!!!! Indicarei seu site para eles. Um abraço!
Oi, Patrícia! Acabei de ler seu comentário lá no YouTube. Fico muito feliz quando recebo esse tipo de mensagem de colegas!
Um abraço,