Ninguém duvida de que a língua portuguesa descende da latina e esse conhecimento é reforçado pelos livros didáticos adotados pelas escolas brasileiras; conferir isso é simples: basta olhar o catálogo do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD). Os autores mais tradicionais fazem, ainda, a alusão aos elementos gregos e árabes, mas deixam de fora dois elementos fundamentais para a formação do português brasileiro: as línguas africanas e as indígenas. Se o material didático recebido pelo professor é falho nesse sentido, como resolver esse problema e mostrar aos alunos que nem só de latim vive a língua portuguesa?
Como o tema costuma ser abordado?
Os elementos africanos e indígenas quase não aparecem em nossos livros; quando são lembrados, vêm em uma lista de elementos “exóticos”. O que isso significa?
e.xó.ti.co. adj. 1. que não é do país em que ocorre; estrangeiro. 2. esquisito, extravagante. (HOUAISS, 2012, p. 341)
Com a escravidão negra, chegaram ao Brasil cerca de 300 línguas africanas; quando os portugueses chegaram, havia aqui mais de 300 línguas indígenas. Entendo a classificação para os elementos africanos (“estrangeiros”), mas não a compreendo quando penso nos falares indígenas. Não aceito “esquisito” e “extravagante” em nenhum dos dois casos! Aceitar isso seria concordar com o equívoco de que existe uma língua melhor do que outra.
O que é possível fazer apesar dos livros didáticos?
Eu costumo abordar as culturas indígenas em diversos pontos do programa de ensino de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira. Uma das estratégias utilizadas é o uso de documentários que me permitam tratar do assunto sem ser caricata. Separei três deles:
Povos índigenas: conhecer para valorizar
O documentário foi produzido pela FUNAI em 2011 e apresenta as culturas indígenas a partir de alguns mitos sobre os indígenas. Eu o utilizo em conjunto com o artigo “O que pensam os brasileiros sobre os índios brasileiros”, de Gersen Baniwa. Os dois materiais podem ajudar o professor a identificar (e desfazer!) alguns preconceitos acerca daquela população.
Índios Pataxó e a terra do descobrimento
Produzido pela jornalista Paula Saldanha, o documentário mostra o modo de vida dos grupos indígenas da região de Porto Seguro. Estes indígenas – retratados na Carta de Pero Vaz – falam sobre o impacto do Descobrimento e como conseguiram fazer o resgate de sua cultura.
Índios no Brasil: 180 línguas, 200 povos
Esse documentário é produzido por indígenas e aborda a questão linguística. Os entrevistados falam do processo de dominação europeia por que passaram os grupos e quais ações foram realizadas para a recuperação de sua identidade. Pode ser usado como motivação para uma pesquisa do vocabulário indígena incorporado ao português brasileiro.
O que pode ser feito além da apresentação dos vídeos?
Depois do século XV, época das navegações ultramarinas e das conquistas territoriais, muitas palavras foram introduzidas na língua portuguesa; a essa época, correspondem os elementos africanos, americanos e asiáticos. Herdamos palavras que designam, em geral, lugares, rios, vegetais, utensílios domésticos e nomes próprios (FERREIRA, 1988, p. 9). O professor de Língua Portuguesa pode orientar os alunos em uma pesquisa sobre vocábulos de línguas indígenas presentes em nosso idioma.
Leia também:
O elemento indígena no português do Brasil
Dia do índio e culturas indígenas nas escolas
Romantismo brasileiro e culturas indígenas
Referência:
BANIWA, Gersen. O que pensam os brasileiros sobre os indígenas brasileiros?. BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. O índio brasileiro: o que você precisa saber sobre os povos indígenas no Brasil hoje. Rio de Janeiro: Museu Nacional, 2006, p. 34-37. Disponível em <http://unesdoc.unesco.org/images/0015/001545/154565por.pdf>. Acesso em 18 set 2017
FERREIRA, M.A.S.C. Origem da língua portuguesa. Estrutura e formação de palavras – teoria e prática. São Paulo: Atual, 1988, p. 1 – 13.