Tereza Batista: cobre e mel é o título de uma monografia escrita por mim em 1998, ocasião em que concluí a pós-graduação em Teoria Literária. Naquela época, a pós oferecida pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro exigia a produção de quatro trabalhos do tipo e eu escrevi sobre Tereza (Tereza Batista Cansada de Guerra), Macabéia (A hora da Estrela), Lúcia McCartney (de obra homônima) e Peter Stilmann (Trilogia de Nova York). Tereza foi a personagem que mais me encantou – depois dela só Dona Flor me encanta mais. Hoje, 10 de agosto, comemora-se o centenário de seu criador, Jorge Amado. Por essa razão, tirei a minha Tereza dos arquivos e escrevo sobre ela novamente.
Tereza Batista nasceu entre o Sergipe e Bahia e era órfã de pai de mãe, “sozinha no mundo, sozinha contra Deus e o diabo…”. A menina fora vendida aos treze anos por uma tia de nome Felipa; vendida a baixo preço e em troca de comida, como tantas meninas do sertão. O comprador era o Capitão Justiniano da Rosa, que levava no pescoço um colar de argolas de ouro – uma para cada menina comprada e deflorada.
A personagem principal vive sucessivos momentos de coroação e destronamento. A carnavalização em Tereza Batista Cansada de Guerra ocorre por meio de transformação, morte e renovação. Quando Tereza foi vendida, perdeu sua inocência e transformou-se. Quando conheceu o leviano Daniel, matou o Capitão Justo com uma faca de cortar carne seca e virou assassina. A renovação só viria com Januário Gereba, o pescador, e Emiliano Guedes, o usineiro. O primeiro seria seu amor da vida inteira; o segundo, o primeiro a lhe tratar com respeito.
Os amigos diziam que Tereza tinha cor de cobre e coração de mel: dura com os desafetos e doce com os amigos. Era calorosa como pimenta e cachaça. Assim como acontece em outras obras, Tereza Batista Cansada de Guerra explora a culinária. Janu foi à cozinha preparar moqueca quando a amada conseguiu sua libertação da cadeia: peixe, azeite de dendê, limão, pimenta malagueta, ervas de cheiro. Os temperos eram afrodisíacos, fortes como o amor dos dois.
Jorge Amado era adepto do Candomblé e ocupava um posto importante em sua religião e esse aspecto de sua biografia transparece em suas obras. Em diversos trechos, Tereza aparece associada a algum ente religioso. O relato sobre seu nascimento mostra a personagem como filha de todos os santos, assim como a Bahia:
Deseja saber a verdade sobre o santo de Tereza, quem lhe determina a vida e protege contra o mal, o anjo da guarda, o dono da cabeça? […] Até quem muito sabe nesse caso se atrapalha na leitura dos búzios sobre a mesa. Muita gente andou por aí e não houve acordo. Os mais antigos falaram em Yansã, os mais recentes em Yemanjá. A si disseram Oxalá, Oxóssi, […]Ewá e Oxumaré […]. Não se esqueça de Ogum e de Nanã, tampouco de Omulu. Também fiz o jogo e olhei no fundo […]. Vendo Tereza Batista por todos os lados cercada e defendida, os orixás em seu redor, […] eu lhe disse: confie na vida e siga adiante. (p. 275-276)
Tereza sofreu muitas metamorfoses que ficaram evidentes pelos apelidos que lhe foram atribuídos por amigos e inimigos: A Moça do Cobre, Tereza Navalhada, Tereza do Bamboleio, Tereza dos Sete Suspiros, Tereza do Pisar Macio, Tereza de Omulu, Tereza Medo Acabou, Tereza da Bexiga Negra, Tereza Favo de Mel.
A personagem é uma das muitas mulheres de Jorge Amado: Florípedes, Tieta, Gabriela, Rosa, Lívia, Malvina. Suas obras, geralmente, são conduzidas por protagonistas femininas e têm personagens secundárias bastante valorizadas. Cada uma delas representa um aspecto da época retratada na obra: da pedofilia vista como normalidade à recusa da submissão da mulher.
Em 1992, a Rede Globo apresentou a minissérie Tereza Batista Cansada de Guerra, com a estreante Patrícia França no papel principal. Assista a um trecho:
Duração: 1h32min.
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Referências:
AMADO, J. Tereza Batista Cansada de Guerra. São Paulo: Martins, 1970.