Ontem, 12 de junho, comemorou-se, no Brasil, o Dia dos Namorados. No dia anterior, eu e uma de minhas turmas do Ensino Médio analisamos (e cantamos!) parte da canção Mina do condomínio, de Jorge Mário da Silva (Seu Jorge). Abaixo, seguem algumas das observações que fizemos durante a aula e outras que proponho aos professores que também desejarem realizar a atividade.
Mina do condomínio
Tô namorando aquela mina
Mas não sei se ela me namora
Mina maneira do condomínio
Lá do bairro onde eu moro
Seu cabelo me alucina
Sua boca me devora
Sua voz me ilumina
Seu olhar me apavora
Me perdi no seu sorriso
Nem preciso me encontrar
Não me mostre o paraíso
Que se eu for, não vou voltar
Pois eu vou
Eu vou
Eu digo “oi”, ela nem nada
Passa na minha calçada
Dou bom dia, ela nem liga
Se ela chega, eu paro tudo
Se ela passa, eu fico doido
Se vem vindo, eu faço figa
Eu mando um beijo, ela não pega
Pisco olho, ela se nega
Faço pose, ela não vê
Jogo charme, ela ignora
Chego junto, ela sai fora
Eu escrevo, ela não lê
Minha mina
Minha amiga
Minha namorada
Minha gata
Minha sina
Do meu condomínio
Minha musa
Minha vida
Minha monalisa
Minha vênus
Minha deusa
Quero seu fascínio
Inicialmente, foram propostas as seguintes perguntas*:
1. Que marcas textuais remetem à variedade linguística da qual mina faz parte?
2. O texto apresenta uma informação contraditória. Identifique-a.
3. Qual o recurso estilístico utilizado para imprimir musicalidade e ritmo aos versos da primeira estrofe?
4. Uma das estrofes apresenta a relação entre o eu lírico e a mina do condomínio por meio de orações coordenadas assindéticas. Reescreva a frase, utilizando diferentes conjunções que expressem a relação de sentido entre as duas orações de cada período.
Ao analisar a canção, consideramos aspectos como a variedade linguística representada pelo uso da palavra mina, figuras de pensamento e de construção utilizados na elaboração do texto, estrutura dos períodos.
Em “Tô namorando aquela mina /mas não sei se ela me namora…”, pode-se observar uma informação contraditória introduzida pela conjunção coordenativa adversativa mas: o eu lírico afirma namorar uma moça e ao mesmo tempo afirma não saber se o sentimento é recíproco. Como figura de linguagem, o mesmo trecho contém um paradoxo.
Observamos, ainda, que, na maioria dos versos, foi utilizada a aliteração como recurso estilístico para imprimir musicalidade ao texto. É o que acontece em trechos como “Tô namorando aquela mina / Mas não sei se ela me namora / Mina maneira do condomínio / Lá do bairro onde eu moro”, em que ocorre a repetição da consoante bilabial [m]; a mesma figura de linguagem aparece em “Seu cabelo me alucina /Sua boca me devora/ Sua voz me ilumina/ Seu olhar me apavora”, em que ocorre a repetição do som consonantal representado pelas letras S e C.
Encontramos também as anáforas presentes ao longo do texto; esta figura de linguagem caracteriza-se pela repetição da mesma palavra no começo de cada um dos versos. É o que podemos observar no trecho “Minha mina /Minha amiga/Minha namorada/ Minha gata/ Minha sina”.
Analisamos também a estrutura sintática de alguns versos. No trecho “Eu mando um beijo, ela não pega /Pisco olho, ela se nega/ Faço pose, ela não vê /Jogo charme, ela ignora /Chego junto, ela sai fora /Eu escrevo, ela não lê”, observamos o uso de orações coordenadas assindéticas. Após identificarmos a relação de sentido estabelecida entre as orações, reescrevemos cada uma delas inserindo as conjunções que estavam elípticas: eu mando um beijo, mas ela não pega…
Há, ainda, outros aspectos que podem ser aproveitados pelo professor de língua portuguesa: o uso do pronome demonstrativo e o aspecto semântico do advérbio de lugar utilizados na primeira estrofe; expressões que remetem à oralidade como em “Não me mostre o paraíso / que se eu for não vou voltar” e “Chego junto, ela sai fora”.
Um boa opção para encerrar a aula é assistir ao vídeo com o show do Seu Jorge ou pedir à turma que cante a canção.
*As perguntas que motivaram a atividade foram adaptadas do livro didático Português, 2º ano, Ensino Médio, organizado pelo professor Ricardo Gonçalves Barreto e editado pela SM.
Achava interessante também que o professor orientasse a reflexão sobre o significado da letra, sobretudo do ponto de vista da mulher. Ninguém “namora” ninguém sozinho, e fica claro que a “mina” não demonstra o menor interesse no eu lírico (o cara, o rapaz).
Mesmo dizendo “digo oi ela nem nada”, “chego junto, ela sai fora” ele insiste em dar bom dia, pisca o olho, manda beijo… Narrando o que me parece muito mais um assédio insistente, uma falta de respeito à liberdade da moça de ir e vir sem ser perturbada. A falta de educação masculina que nós mulheres brasileiras sentimos na pele, diariamente. Sinto nojo dessa letra e uma decepção enorme com Seu Jorge, que já teve sua época de letras boas, mas essa aí…que tristeza.
Vera, obrigada pela visita e pelo comentário.