O Arcadismo – também chamado de Setecentismo ou Neoclassicismo – desenvolveu-se na segunda metade do século XVIII, o Século das Luzes. O movimento literário surgiu em 1690, em Roma, com o propósito de combater o barroquismo e cultivar a lírica amorosa e bucólica. Em Portugal, o Neoclassicismo teve início no período pombalino e, no Brasil, em 1768, com a publicação de Obras Poéticas, de Cláudio Manuel da Costa.
O Arcadismo está relacionado historicamente ao Iluminismo – o mais importante movimento intelectual do século XVIII e que propunha o uso da razão como meio para satisfazer as necessidades humanas. Os iluministas defendiam o laicismo, concepção segundo a qual Estado e Igreja deveriam ser independentes e o as funções do Estado – política, economia, educação – deveriam ser exercidas por leigos e não pela Igreja. Naquele século, a Europa passou por diversas transformações como descrédito de monarquias absolutistas, a decadência da aristocracia feudal, a revolução industrial inglesa e a Revolução Francesa.
Em Portugal, o século XVIII foi marcado pelo longo reinado de D.João V (1706 – 1750) e pelo despotismo esclarecido do Marquês de Pombal, ministro de D. José I no período de 1750 a 1777. Durante o reinado de D. João V, foram construídos o suntuoso Palácio de Mafra e o Aqueduto das Águas Livres de Lisboa. D. José I, sucessor de D. João V, escolheu novo governo e nomeou Sebastião José Carvalho e Melo para a Secretaria dos Estrangeiros e Guerra; Sebastião José recebeu o título de Marquês de Pombal apenas em 1770. Ele foi o responsável pela reforma educacional brasileira que proibiu, em 1757, o uso do tupi como língua usada no Brasil.
No Brasil, o Arcadismo corresponde ao Ciclo do Ouro. Com a descoberta do ouro em Minas Gerais, o sudeste passa a ser o centro político da Colônia. Assim, Vila Rica (atual Ouro Preto) e Rio de Janeiro (capital do Vice-Reino até 1763), passaram a ser os grande polos de produção e comércio. As ideias do Iluminismo chegavam ao Brasil por meio de uma pequena burguesia letrada – bacharéis de Direito formados em Coimbra, padres, militares – que, em 1760, fomentou a revolta contra os impostos altíssimos cobrados pela Coroa e deu origem ao movimento que ficou conhecido como Inconfidência Mineira. Foi neste contexto que surgiu o Neoclassicismo brasileiro.
São características da literatura árcade:
1. Personagens mitológicas.
2. Bucolismo e pastoralismo. A vida campestre é mostrada de maneira estilizada e idealizada. O eu lírico apresenta-se como um pastor e a mulher amada, como uma pastora. É o que acontece, por exemplo, na obra Marília de Dirceu, de Tomás Antônio Gonzaga, em que o eu lírico inicia sua apresentação mostrando à dama suas características:
Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,
Que viva de guardar alheio gado;
De tosco trato, d’expressões grosseiro,
Dos frios gelos e dos sóis queimado.
Tenho próprio casal e nele assisto;
Dá-me vinho, legume, fruta, azeite;
Das brancas ovelhinhas tiro o leite,
E as mais finas lãs, de que me visto.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela
3. Locus amoenus (lugar ameno): o cenário retratado no poema árcade remete à idealização da natureza como lugar perfeito; assim, fazem parte deste cenário as flores, as águas murmurantes, o canto dos pássaros, a brisa agradável.
4. Fugere urbem (fugir da cidade): a cidade é descrita como fonte de sofrimento e corrupção. Esta característica está diretamente ligada à anterior; já que a cidade é lugar de tormentos, o campo é apresentado como a solução.
5. Aurea mediocritas (mediania de ouro): A expressão era usada pelo poeta Horácio para se referir a uma situação de equilíbrio.
6. Estoicismo: desprezo dos prazeres, do luxo e das riquezas.
Na literatura árcade brasileira, também era possível encontrar temas relacionados à cultura local: descrição da paisagem local; elementos da flora e da fauna brasileiras; mineração em Minas Gerais; descrição de episódios da vida da Colônia; utilização do índio como tema literário (uma antecipação do que seria feito pelos poetas românticos).
Os principais poetas árcades portugueses e brasileiros são Manuel Maria Barbosa du Bocage, Cláudio Manuel da Costa, Tomás Antônio Gonzaga e Basílio da Gama.
O Arcadismo foi tema da questão 12 na prova do ENEM 2008:
Torno a ver-vos, ó montes; o destino
Aqui me torna a pôr nestes outeiros,
Onde um tempo os gabões deixei grosseiros
Pelo traje da Corte, rico e fino.
Aqui estou entre Almendro, entre Corino,
Os meus fiéis, meus doces companheiros,
Vendo correr os míseros vaqueiros
Atrás de seu cansado desatino.
Se o bem desta choupana pode tanto,
Que chega a ter mais preço, e mais valia
Que, da Cidade, o lisonjeiro encanto,
Aqui descanse a louca fantasia,
E o que até agora se tornava em pranto
Se converta em afetos de alegria.
(Cláudio Manoel da Costa. In: Domício Proença Filho. A poesia dos inconfidentes. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2002, p. 78-9.)
Considerando o soneto de Cláudio Manoel da Costa e os elementos constitutivos do Arcadismo brasileiro, assinale a opção correta acerca da relação entre o poema e omomento histórico de sua produção.
(a) Os “montes” e “outeiros”, mencionados na primeira estrofe, são imagens relacionadas à metrópole, ou seja, ao lugar onde o poeta se vestiu com traje “rico e fino”.
(b) A oposição entre a Colônia e a Metrópole, como núcleo do poema, revela uma contradição vivenciada pelo poeta, dividido entre a civilidade do mundo urbano da Metrópole e a rusticidade da terra da Colônia.
(c) O bucolismo presente nas imagens do poema é elemento estético do Arcadismo que evidencia a preocupação do poeta árcade em realizar uma representação literária realista da vida nacional.
(d) A relação de vantagem da “choupana” sobre a “Cidade”, na terceira estrofe, é formulação literária que reproduz a condição histórica paradoxalmente vantajosa da Colônia sobre a Metrópole.
(e) A realidade de atraso social, político e econômico do Brasil Colônia está representada esteticamente no poema pela referência, na última estrofe, à transformação do pranto em alegria.
Comentário sobre a questão:
Letra B. O poema é construído com base na ideia de fugere urbem e locus amoenus, uma vez que sugere a nostalgia do eu lírico enquanto refere-se ao seu lugar de origem. O lugar ameno, neste caso, é representado pela Colônia.
Leia mais no blog:
Tiradentes, os inconfidentes e a literatura (com arquivo para baixar)
Tiradentes, literatura e cinema
Fontes de pesquisa:
AMARAL, E. ; FERREIRA, M. ; LEITE, R. ANTÔNIO, S. Novas palavras: português. 2.ed. São Paulo: FTD, 2003.
CANDIDO, A. Formação da literatura brasileira: momentos decisivos. 7. ed. Rio de Janeiro: Itatiaia, 1993.
COUTINHO, A. Introdução à literatura no Brasil. 16. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1995.
GONZAGA, T. A. Marília de Dirceu. Rio de Janeiro: Ediouro, 1990.
SARAIVA, J. H. História concisa de Portugal. 17. ed. Sintra: Europa-América, 1995 (Coleção Saber, 123)
Que legal você ter colocado as referências! Obrigada, complementou meus estudos! 😀
Me ajudou muito!!!! Obrigadoo