A aula era sobre formação de palavras e fazíamos algumas comparações entre os prefixos latinos e gregos. Em nossa lista de correspondências apareceram elementos como anfí- e ambi- que, apesar da origem diferente, têm o mesmo sentido: duplicidade. Pensamos, então, em palavras como anfíbio, ambivalente, ambiguidade, anfiteatro. Uma de minhas alunas fez-me a seguinte pergunta: “E a palavra anfitrião também tem a ver com isso?”. Vejamos o significado de anfitrião no Dicionário Houaiss:
anfitrião. s.m. o dono da casa, o que recebe convidados.
Na mesma hora, lembrei-me de ter lido algo a respeito em uma de minhas revistas e expliquei à aluna que não se sabe ao certo a origem da palavra “anfitrião”, mas o primeiro a usá-la com o sentido descrito pelos dicionários foi o dramaturgo francês Molière em sua comédia Amphitryon. Qual era, então, o sentido original? O professor Mário da Gama Kury, no Dicionário de Mitologia Grega e Romana, conta-nos a história do príncipe tebano Anfitrião, que resumirei a seguir:
Anfitrião era filho de Alceu e Astidâmia e participou da guerra entre seu tio Electríon, rei de Micenas, e Pterelau, pretendente ao trono daquele reino. Os filhos dos dois rivais morreram na batalha, salvando-se apenas Licímio, filho do primeiro, e Eueres, filho do segundo. Revoltado com a morte dos outros filhos, Electríon declarou nova guerra, mas, ao partir para a batalha, confiou o reino e a filha Alcmene a Anfitrião, fazendo-o prometer que protegeria e respeitaria a virgem até seu retorno. Terminada a guerra, o pai da moça voltou à cidade e Anfitrião devolveu-lhe o rebanho, mas uma vaca furiosa assustou o princípe e este, na tentativa de se proteger, lançou-lhe uma estaca que acabou por matar o sogro. Almene ainda desejava vingar a morte da família e condicionou o casamento à vingança da morte dos irmãos, o que foi aceito por seu noivo. Zeus, o principal deus da mitologia grega, apaixonado por Alcmene, aproveitou-se da ausência de Anfitrião e , assumindo sua aparência, seduziu a moça e gerou Héracles. Anfitrião, sem nada saber, regressou à cidade e também se uniu a Alcmene, gerando Ificles. Anfitrião foi informado pelo sábio Tirésias que Zeus enganara Alcmene e o príncipe decidiu, deste modo, perdoar a esposa. A fim de saber qual dos gêmeos era seu filho, Zeus e Anfitrião expuseram os bebês a um grande perigo: lançaram duas serpentes no berço; Ificlés temeu os animais, mas Héracles as estrangulou, ação que serviu para comprovar sua origem divina. (KURY, 2003, p.32-33)
Confesso ter me equivocado, durante a aula, a respeito de alguns detalhes sobre o mito de Anfitrião. Apesar disto, os alunos perceberam algo no nome do príncipe: a duplicidade expressa pelo prefixo anfi- (o motivo de toda essa conversa mitológica) aparecia indiretamente na farsa criada por Zeus, ao assumir a fora do marido de Alcmena. Não sabemos se nossa percepção está certa ou se não passa de uma “viagem” como exclamou um outro aluno. Este texto foi escrito para os meus alunos do Ensino Médio, a quem eu prometi publicar uma das perguntas feitas durante a aula de ontem, dia 19 de novembro de 2010.
Fontes de pesquisa:
ETIMOLOGIA – a origem das palavras. Revista Língua Portuguesa Especial 2. Março de 2007.
KURY, Mário da Gama. Dicionário de Mitologia Grega e Romana. 7.ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.
Acho que a origem deve ser em base esse mito sobre ele, mas que depois foi usado pela grande classe pra se tratar de alguém que lhe recebe em casa e faz as coisas que quiser, como uma empregada, mas que em um certo tempo foi chamado aos escravos, e hoje pode-se dizer que mudamos o significado dela pra algo mais “elegante”, onde quem apresenta os espetáculos é chamado de Anfitrião. Então concluo que ela teve algumas mudanças no significado ao longo do tempo.
O texto é exatamente sobre isso.
Victor, obrigada pela visita.
Sempre esclarecedora.
Obrigado, nossa anfitriã, Andréa Motta.