Literatura

“A hora da estrela” – Resumo da live

Ontem, 06 de abril de 2020, aconteceu a primeira live do blog Conversa de Português no Instagram, que aconteceu para substituir aquela que teria como tema a obra Triste fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto. O texto do pré-modernista consta da lista de leitura da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, mas a universidade suspendeu o seu calendário acadêmico, o que me fez adiar também a aula ao vivo sobre aquele livro. Eu e a professora Joseane Ribeiro fizemos, então, uma conversa sobre a obra A hora da estrela, de Clarice Lispector.

A hora da estrela, publicado por Clarice em 1977, conta a história de Macabéa, uma nordestina de 19 anos, órfã de pai, de mãe e da tia que a criou. Migra para o Rio de Janeiro onde consegue um emprego ruim, devido à baixa escolaridade. Namora Olímpico de Jesus, outro nordestino, que a troca por Glória, loura falsa a quem o rapaz vê como símbolo de sucesso na vida. Macabéa é tratada pelo narrador como “incompetente para a vida”.

Em nossa live, consideramos quatro possibilidades de leitura para a obra de Clarice: a partir da “Dedicatória do autor”, a partir dos seus treze títulos, a partir da nomeação de seus personagens e a partir da descrição de Macabéa.

Dedicatória do autor

Ao considerarmos a “Dedicatória do autor”, encontramos um narrador em primeira pessoa que afirma ter visto, no meio da multidão, o rosto de uma nordestina. Ele tem um sentimento de urgência em relação a ela e precisa escrever sobre aquela moça. Durante a live, destacamos algumas especificidades desse narrador. É um personagem raro em Clarice: esse narrador não sabe nada sobre a personagem que ele irá criar e sofre ao criar tal narrativa.

13 títulos

A hora da estrela contém 14 títulos: A culpa é minha ou A hora da estrela ou Ela que se arranje ou O direito ao grito Clarice Lispector Quanto ao futuro ou Lamento de um Blue ou Ela não sabe gritar ou Uma sensação de perda ou Assovio no vento escuro ou Eu não posso fazer nada ou Registro dos fatos antecedentes ou História lacrimogênica de cordel ou Saída discreta pela porta dos fundos. (LISPECTOR, 1995, p. 23). Todos eles que podem ser vistos possibilidades diferentes de leitura e destacamos alguns deles:

A hora da estrela Esse título remete diretamente à última cena do livro: Macabéa só recebe atenção verdadeira na hora da morte.

A culpa é minha Esse é o segundo título da lista e remete a uma fala de Rodrigo S.M. É ele o criador de Macabéa. É a partir de seu “sim” que toda a narrativa é elaborada (“Tudo começou com um sim”).

Ela não sabe gritar Macabéa é frágil, não sabe se defender. É aquela que sofre um relacionamento abusivo, mas pede desculpas por aquilo que lhe fazem. Ela não se defende das ofensas do namorado (com quem sai apenas uma vez). Maca não se defende da falsa amiga que lhe rouba Olímpico.

A nomeação dos personagens

Chama-me atenção a maneira como Clarice parece ter escolhido o nome de cada personagem; é como se, por meio desse detalhe, ela adiantasse ao leitor quem é cada um na narrativa.

Rodrigo S.M. É ele o narrador/autor de A hora da estrela. O nome Rodrigo , de origem germânica, entrou na língua portuguesa pelo latim “Rodericus”, cujo significado é “o rei, o que reina, o governante poderoso. É Rodrigo que define, como um deus, tudo o que acontecerá com a protagonista. Sua definição, suas decisões determinam toda a ação (“Tudo começou com um sim.” p. 25).

Macabéa. Fizemos a .relação com o livros bíblicos I e II Macabeus. Os únicos textos na bíblia que fazem referência explícita ao povo de Israel durante o período helênico (“Depois que Alexandre, filho de Filipe, macedônio saído da terra de Cetim, venceu Dario, rei dos persas…” (1 Mac 1, 1). Esses livros trazem o relato sobre as lutas travadas pelo povo judeu contra os selêucidas, a fim de obter liberdade religiosa e política. Ao contrário desse povo antigo, Macabéa não sabe lutar ou como avisa o oitavo título “ela não sabe gritar”.

Olímpico. a referência ao Olimpo (monte lendário da cultura grega, onde viveriam os deuses) é bastante óbvia. O suposto namorado de Macabéa sente-se superior a ela. Ele também migrante nordestino contrapõe-se em tudo à nossa protagonista. E aqui temos a Maca (que traz o povo judeu à memória do leitor por meio de seu nome) humilhada o tempo todo por esse personagem arrogante.

Glória. Olímpico, como um grego antigo, busca o tempo todo aquilo que lhe dará algum símbolo de status: primeiro, o dente de ouro; depois, Glória, mulher “cheias de curvas, cabelo platinado”, oposto de Macabéa.

A descrição de Macabéa

Não é comum, na obra de Clarice, encontrarmos a descrição física dos personagens. Não sabemos como é Laura (Imitação da rosa), nem Ana (O jantar), nem G.H (A paixão segundo G.H), mas Macabéa é muito adjetivada: 19 anos, nordestina, feia, magra, com dor de dentes.

A participação dos seguidores foi incrível e, ao longo do dia, recebi muitas mensagens de pessoas que se sentiram incentivadas a ler Clarice. Em breve, divulgarei a próxima live do Conversa de Português no Instagram. Não deixe de seguir: @conversadeportugues.

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Andréa Motta

Professora de Língua Portuguesa , Literatura e Formação do Leitor Literário no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro.

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