A cultura afro-brasileira precisa ser abordada no ambiente escolar, uma vez que é parte importantíssima na formação do povo brasileiro. Os negros escravizados deixaram diversos legados em nossa história: vocabulário, indumentária, culinária, música, religião. Será que essa influência só deve ser lembrada no 13 de maio ou é possível promover ações sobre o tema durante todo o ano letivo? Que discussões podem ser realizadas? Que eventos o professor pode promover? O que ler sobre o assunto? Eu separei algumas dicas sobre o tema; são atividades que eu – professora da rede federal há 12 anos – já realizei em minhas turmas.
A Lei nº 10.639/03 (atualizada pela Lei nº 11.645/08) determina o ensino de cultura afro-brasileira nas escolas. Em 16 de fevereiro de 2017, foi promulgada a Lei Nº 13.415 que – apesar dos boatos espalhados pelas redes sociais – não revogou o ensino daquela cultura. A questão é: com ou sem obrigação legal, é necessário abordar o tema. Confira o texto da 10.639:
Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena. (Redação dada pela Lei nº 11.645, de 2008).
§ 1o O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá diversos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação da população brasileira, a partir desses dois grupos étnicos, tais como o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros e dos povos indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e o negro e o índio na formação da sociedade nacional, resgatando as suas contribuições nas áreas social, econômica e política, pertinentes à história do Brasil. (Redação dada pela Lei nº 11.645, de 2008).
§ 2o Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira e dos povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de educação artística e de literatura e história brasileiras. (Redação dada pela Lei nº 11.645, de 2008).
Do início do século XVI ao final do século XIX, foram trazidos ao Brasil cerca de 5 milhões de negros escravizados, oriundos de duas regiões subsaarianas: a região banto – situada ao sul da linha do Equador – e a região sudanesa – do Sudão à Nigéria. Somente o primeiro grupo corresponde a um conjunto de cerca de 500 línguas; segundo a pesquisadora Yeda Pessoa de Castro (2009), entre elas as de maior número de falantes no Brasil foram três línguas angolanas: quicongo, quimbundo e umbundo.
O professor pode promover uma pesquisa por meio da qual seja feito um levantamento de palavras africanas presentes no vocabulário brasileiro. É importante que o professor destaque de que maneira tais vocábulos foram incorporados ao nosso léxico. Os livros didáticos e as gramáticas normativas geralmente abordam o tema (quando o fazem!) com uma lista superficial de palavras a que chamam de “vocábulos exóticos”.
É necessário lembrar, ainda, o papel importantíssimo das mulheres negras nessa relação linguística: essas negras escravizadas circulavam da casa grande à senzala, muitos termos foram trocados entre esses povos.
O professor pode perguntar aos alunos quem conhece algum escritor negro na literatura brasileira. Pode parecer uma pergunta tola, mas pode trazer ao docente uma triste constatação: nossos estudantes não conhecem nossos autores negros! Esse será um momento para o professor debater também a ideia de negritude: será que apenas o tom da pele define se somos negros ou brancos? Lembro da surpresa de uma antiga turma ao descobrir que Machado de Assis – o maior nome de nossa literatura – era negro, morador de morro e filho de lavadeira.
O professor pode citar e selecionar alguns textos de Machado de Assis, Castro Alves, Cruz e Souza, Elisa Lucinda, Joel Rufino dos Santos, Auta de Souza, Conceição Evaristo. Pode-se propor a reflexão sobre a maneira como o povo negro é retratado nas obras literárias brasileiras em diversas épocas: aparecem como personagens principais? São apenas figurantes? Como sua cultura é retratada? A partir de que momento recebem mais destaque?
Essa atividade pode ser realizada em qualquer outra disciplina, mas pode ser combinada entre os professores de Língua Portuguesa, Literatura e História. No Rio de Janeiro, por exemplo, há a possibilidade de visitação a lugares históricos como o Cais do Valongo, a Pedra do Sal e tantos outros. O professor pode pesquisar, em sua cidade, sobre lugares em que há uma significativa contribuição da cultura negra e tentar agendar uma visita com as turmas.
Leia no blog:
África no português brasileiro
Língua portuguesa e cultura afro nas escolas
[Sala de Aula ] A terceira geração romântica
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Referência bibliográfica:
CASTRO, Y.P. Línguas africanas e o português do Brasil. Revista Biblioteca Entre Livros – Especial África. São Paulo: Duetto, 2009, p. 70 – 73.