O Modernismo foi um importante movimento artístico no início do século XX. Quando pensamos sobre a literatura modernista, é necessário observar que ele não corresponde a um só tipo de expressão, mas a um conjunto de ideias inspiradas no Manifesto do Futurismo de 1917. As obras modernistas são um tema bastante explorado nos exames vestibulares e também apareceu no ENEM 2016. Veja nosso comentário sobre a questão 119 do caderno cinza.
QUESTÃO 119
Antiode
Poesia, não será esse
o sentido em que
ainda te escrevo:
flor! (Te escrevo:
flor! Não uma
flor, nem aquela
flor-virtude — em
disfarçados urinóis).
Flor é a palavra
flor; verso inscrito
no verso, como as
manhãs no tempo.
Flor é o salto
da ave para o voo:
o salto fora do sono
quando teu tecido
se rompe; é uma explosão
posta a funcionar,
como uma máquina,
uma jarra de flores.
(MELO NETO, J.C. Psicologia da composição. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997)
A poesia é marcada pela recriação do objeto por meio da linguagem, sem necessariamente explicá-lo. Nesse fragmento de João Cabral de Melo Neto, poeta da geração de 1945, o sujeito lírico propõe a recriação poética de
(A) uma palavra, a partir de imagens com as quais ela pode ser comparada, a fim de assumir novos significados.
(B) um urinol, uma referência às artes visuais ligadas às vanguardas do início do século XX.
(C) uma ave, que compõe, com seus movimentos, uma imagem historicamente ligada à palavra poética.
(D) uma máquina, levando em consideração a relevância do discurso técnico-científico pós-Revolução Industrial.
(E) um tecido, visto que sua composição depende de elementos intrínsecos ao eu lírico.
Gabarito oficial: A
Comentário:
João Cabral de Melo Neto é um dos principais escritores da Terceira Geração Modernista (ou Geração de 45). Como já explicamos em outro texto, esse grupo dedicou-se à pesquisa sobre a linguagem literária e à experimentação estética, embora não tivesse proposto um novo movimento literário.
Um dos recursos linguísticos presentes na obra de João Cabral é a metalinguagem, função linguística por meio da qual explica-se a própria linguagem. É metalinguístico, por exemplo, um texto literário em que se demonstre o processo de criação do autor; é o que acontece no poema escolhido pela banca do Exame: “Poesia, não será esse / o sentido em que / ainda te escrevo”.
Em uma leitura atenta, observamos que o interlocutor do texto é a poesia, com quem o escritor — em seu processo criativo — conversa. Para conseguir esse efeito, utilizou-se de uma apóstrofe: figura de pensamento caracterizada pela referência direta ao interlocutor.
O poema de João Cabral brinca com uma das características do texto literário: a liberdade de criação. Assim, o autor propõe a ressignificação da palavra flor. Embora no trecho “flor é a palavra flor”, ele tenha avisado que usaria apenas o sentido denotativo, o que o leitor percebe ao longo do texto é exatamente o oposto: “flor é o salto / da ave para o voo”.
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