O Romantismo brasileiro é um dos principais tópicos de literatura apresentados no segundo ano do Ensino Médio. Em 5 de abril, eu iniciei as discussões sobre a primeira geração romântica em uma de minhas turmas, mas optei por fazer uma abordagem diferente da tradicional e é isso que conto nesta edição da coluna Sala de Aula. O objetivo desta aula era apresentar o movimento literário do Romantismo e, ao mesmo tempo, desfazer a imagem romântica (idealizada) acerca das comunidades indígenas.
Escrevi no quadro o tema da aula – Romantismo – e indaguei à turma sobre o significado da palavra; no entanto, deixei claro que não desejava uma resposta como a que apareceria em um dicionário, nem uma resposta técnica como em um livro didático. Eu queria saber a concepção de cada um e as respostas foram: amor, estar apaixonado. Em seguida, entreguei o texto Minha terra, de Gonçalves Dias, e pedi aos alunos que o lessem e dissessem se o texto correspondia às suas ideias sobre o que significa ser romântico.
A apresentação do tema foi feita em quatro aulas de 45 minutos (Eu vejo a turma apenas uma vez por semana e nosso encontro dura, ao todo, 3 horas). Veja abaixo como a atividade foi desenvolvida.
1º momento: Apresentação do tema da aula
Minha terra!
Gonçalves Dias
Quanto é grato em terra estranha
Sob um céu menos querido,
Entre feições estrangeiras,
Ver um rosto conhecido;
Ouvir a pátria linguagem
Do berço balbuciada,
Recordar sabidos casos
Saudosos – da terra amada!
E em tristes serões d’inverno,
Tendo a face contra o lar,
Lembrar o sol que já vimos,
E o nosso ameno luar!
Certo é grato; mais sentido
Se nos bate o coração,
Que para a pátria nos voa,
P’ra onde os nossos estão!
Depois de girar no mundo
Como barco em crespo mar,
Amiga praia nos chama
Lá no horizonte a brilhar.
E vendo os vales e os montes
E a pátria que Deus nos deu,
Possamos dizer contentes:
Tudo isto que vejo é meu!
Meu este sol que me aclara,
Minha esta brisa, estes céus:
Estas praias, bosques, fontes,
Eu os conheço – são meus!
Mais os amo quando volte,
Pois do que por fora vi,
A mais querer minha terra,
E minha gente aprendi.
Paris, 1864.
A turma percebeu que o eu lírico era um brasileiro em terra estrangeira (Paris) e o poema, uma declaração de amor ao Brasil. Com base nessa percepção, conversamos sobre o contexto histórico do Romantismo e as razões pelas quais os intelectuais brasileiros aderiram ao movimento.
O Romantismo brasileiro começa oficialmente 14 anos após o processo de Independência do Brasil. Assim, inspirados pelos movimentos românticos iniciados na Europa, os intelectuais brasileiros também percebem a necessidade de discutir o que era a nossa identidade nacional. Para a compreensão desse conceito, indaguei à turma: Qual o evento histórico brasileiro mais antigo que nós conhecemos? Quais são os indivíduos envolvidos nesse evento? Uma vez que a turma respondeu ser o Descobrimento do Brasil o evento mais antigo de que se lembrava, entreguei-lhes um trecho da Carta de Pero Vaz de Caminha e a usamos para responder à segunda pergunta também. Transcrevo abaixo uma parte do texto lido pelos alunos:
[…] E estando Afonso Lopes, nosso piloto, em um daqueles navios pequenos, por mandado do Capitão, por ser homem vivo e destro para isso, meteu-se logo no esquife a sondar o porto dentro; e tomou dois daqueles homens da terra, mancebos e de bons corpos, que estavam numa almadia. Um deles trazia um arco e seis flechas […]
A feição deles é serem pardos, maneira de avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem feitos. Andam nus, sem cobertura alguma. Não fazem menor caso de encobrir ou de mostrar suas vergonhas; e nisso têm tanta inocência como em mostrar o rosto. Ambos traziam os beiços de baixo furados e metidos neles seus ossos brancos e verdadeiros de comprimento duma mão travessa, da grossura dum fuso de algodão, agudos na ponta como furador. […]
Os cabelos seus são corredios. E andavam tosquiados, de tosquia alta, mais do que de sobre-pente, de boa grandura e rapados até por cima das orelhas. (CAMINHA, 2007, p. 94-97)
Essa etapa da atividade visa à identificação de como o indígena foi descrito na Carta, escrita no século XVI. Nesse momento, entreguei um material teórico com as principais ideias românticas, dentre as quais o indianismo, como projeto de identificar o índio como legítimo dono da terra. O segundo texto lido foi, então, Canto do índio, de Gonçalves Dias*. Indaguei à turma qual a visão sobre os indígenas no século XIX e sobre a nossa no século XXI. Alguns alunos lembraram-se de antepassados indígenas, mas não sabiam dar muitas informações a respeito.
O vídeo abaixo foi utilizado para mostrar aos alunos o impacto da colonização portuguesa na região de Coroa Vermelha, onde vivem os índios Pataxó. O professor pode confrontar as informações do vídeo com as da Carta do Descobrimento. Os alunos deverão perceber que trata-se da mesma etnia.
Se não conseguir visualizar o player, clique aqui.
Quantas línguas e quantas etnias havia no Brasil em 1500? Quantas há hoje? O vídeo abaixo foi apresentado e serviu de base para que os alunos debatessem sobre o processo histórico de aculturação indígena e como isso pode ser revertido.
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Ao final da aula, entreguei aos alunos o artigo O que pensam os brasileiros sobre os indígenas brasileiros?, de Gersen Baniwa. O professor deve chamar a atenção da turma para o fato de Baniwa ser uma das etnias que aparecem nos vídeos.
Leia mais no blog:
Romantismo brasileiro – 1ª geração
Assista à nossa aula no YouTube:
Características gerais do Romantismo
Atualização às 18h36: Baixe alguns textos literários que podem ser usados nas aulas sobre Romantismo Brasileiro. O arquivo inclui os poemas citados neste post. Clique aqui (Será aberta uma pasta do OrangeBox).
Referências:
BANIWA, Gersen. O que pensam os brasileiros sobre os indígenas brasileiros?. BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. O índio brasileiro: o que você precisa saber sobre os povos indígenas no Brasil hoje. Rio de Janeiro: Museu Nacional, 2006, p. 34-37. Disponível em <http://unesdoc.unesco.org/images/0015/001545/154565por.pdf>. Acesso em 3 abr. 2016
CAMINHA, Pero Vaz de. Carta de Pero Vaz de Caminha a el Rei Dom Manuel sobre o achamento do Brasil. São Paulo: Martin Claret, 2007.
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Nota:
Os alunos lerão, durante o semestre, os textos Iracema e I Juca Pirama.
Gostei da forma da abordagem inicial. Sai do tradicional.
Obrigada, Luciene!