Literatura

Sobre o autor – Jean de La Fontaine

Sobre  o  autor  é  uma  coluna  temporária, publicada  no  blog Conversa de  Português às  terças-feiras. Ela   é composta de um texto sobre  autor cujas   obras são consideradas de  domínio público Hoje, a fim de  comemorar  o Dia  das  Crianças, o  autor homenageado será  um clássico da  literatura infantil  e juvenil. O   texto de hoje  é A  gata  metamorfoseada  em   mulher, de  Jean de  La  Fontaine.
Ilustração de  Gustave  Dorè
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A gata metamorfoseada em mulher
(tradução do Barão de Paranapiacaba)

A uma gata que tinha, um tal pascácio
com paixão adorava.
Era tão meiga, delicada e bela!
E tão doce miava!
Doido, mais doido que os que estão no hospício,
o nosso namorado,
>com preces, choro, encantos, sortilégios,
logrou dobrar o fado.
Numa bela manhã nossa gatinha
em mulher se mulher se mudou ;
e o seu adorador, no mesmo dia
por esposa a tomou .
Doido de amor, qual fora de amizade,
o hipocôndrico esposo
julga a mulher _ das perfeições da Terra
santo ideal formoso.
Enche-a de adulações, cobre-se de mimos;
e nem de longe sequer
lhe vê de gata; ilude-se, julgando-a
toda e em tudo mulher.
Uns ratinhos, porém, roendo a esteira,
vieram perturbá-los.
Presto a moça levanta-se do leito;
mas não pôde apanhá-los.
Tornam os ratos a arranhar a esteira;
e a noiva, de gatinhas,
agarra, desta vez, os tais murganhos
com dentes e mãozinhas.
Em forma de mulher os pobres ratos
não na podem fugir,
é deles sorte à gata transformada
de incentivo servir.
Este caso o poder da natureza
nos demonstra de sobra;
passado certo tempo o vaso embebe,
o pano toma a dobra.
Em vão do sestro e propensão que a levam
quereis desavezá-la;
por mais que trabalheis, zomba de tudo;
não podeis reformá-la.
Nem à força de cilha, ou de forcados,
mudará de feição;
nem lograreis o impulso dominar-lhe,
empunhando um bastão.
Fechai-lhe a porta, como se expelísseis
figadal inimigo;
Há de voltar a rápido galope
Ou forçar o postigo.

Ou em  versão mais  recente:

A gata transformada em mulher
(tradução de René Ferri)

Certo indivíduo tinha uma gata a qual simplesmente adorava: achava-a linda, elegante, aristocrática. Até seus miados o extasiavam: o pobre homem havia perdido o juízo. E aquele sujeito, por força de súplicas e lágrimas, de sortilégios e feitiços, conseguiu que o destino transformasse sua gata numa mulher, com a qual se casou imediatamente. Estava louco de amor. Nunca a dama mais bela exerceu tal domínio sobre o amante, como aquela nova esposa sobre seu marido. Ele a mimava e ela correspondia. O marido não via na consorte nem sombra da felina que ela era. E cego de paixão não poder mais, julgou-a mulher perfeita, até que uns ratos pequeninos, que roíam as esteiras, roeram a felicidade dos recém-casados. Assim que a esposa se levantou os ratinhos começaram a correr. Mas voltaram depois e ela voltou a atacá-los, como sucesso desta vez, porque a mudança na sua aparência enganou os roedores.Ratos sempre foram alimento para ela: a força que vem da natureza é gigante! A certa idade, não cabem mais mudanças: aquilo que se mamou no berço se deixa na tumba. Não poderá jamais descartar aquilo que está fincado em seu caráter: se trancar a porta, entrará pela janela.

 

Jean de  La  Fontaine  nasceu  na   França. Ele  foi o responsável  pela   popularização das  fábulas  do  Ocidente; essas  eram  narrativas  da tradição oral e   transmitidas de  geração a geração. Na segunda  metade  do  século  XVII, La  Fontaine publicou  uma coletânea dessas pequenas   fábulas  recolhidas de   Esopo e  Fedro.

Andréa Motta

Professora de Língua Portuguesa , Literatura e Formação do Leitor Literário no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro.

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