Língua Portuguesa

Ainda sobre os pronomes – a pergunta do leitor

No artigo de ontem,  observamos alguns aspectos  de colocação pronominal , em resposta a alguns leitores que enviaram  suas dúvidas ao  blog. A fim de  que o texto não ficasse excessivamente longo,  eu  o  dividi  em  duas  partes: ontem escrevi sobre  a próclise (pronome  antes do verbo) e  hoje escreverei  sobre  a ênclise (pronome depois do verbo), a mesóclise e posição dos pronomes nas  locuções  verbais.

Quando  se  usa  a  ênclise?

Comparemos as  duas  orações:

  • Disseram-me  que   você é  uma  boa  pessoa . (língua  culta)
  • Me disseram  que  você é  uma boa pessoa. (língua coloquial)
Regra básica para  a  ênclise:  No padrão culto, manifestado  principalmente pela  escrita, o pronome  oblíquo átono deve ser  usado sempre depois  do verbo  quando  este inicia a oração.

Quando se  usa a mesóclise, ou seja, o pronome intercalado no verbo? 

Apesar de ser  a colocação  pronominal com  menos  regras, a mesóclise é  praticamente  uma  colocação  pronominal  esquecida – até mesmo pelos  bons escritores e bons  falantes. Há apenas duas regras para  o seu  uso:

1) Verbo  no  futuro ( do presente ou do  pretérito) iniciando a  oração.
2) Ausência de  palavra que  exija  próclise. 
Exemplos: Contar-te-ei  toda a  verdade.  ( contarei  –  futuro do  presente)  /  Dar-lhe-iam uma   nova  oportunidade se ele merecesse? (dariam – futuro do  pretérito)

Observações sobre a mesóclise:

  • Se o verbo, no futuro, não iniciar oração, a mesóclise é  opcional. Ex.: Seus amigos   te contarão a verdade. / Seus  amigos   contar-te-ão  a  verdade.
  • Havendo  palavras  que exija  a próclise , essa colocação prevalece. Ex.:  Não  te contarei a verdade.
E como   usar os  pronomes  átonos  quando   houver  dois verbos  juntos?
O  pronome oblíquo, quando  colocado  junto a dois  verbos, pode,  como  regra geral, ocupar qualquer posição relativamente a eles e  a mais  usual é que ele  se posicione entre os dois  verbos. Alguns gramáticos destacam, ainda, que  brasileiros  e portugueses preferem  formas  diferentes de colocação pronominal junto aos  verbos, o que reforça a idéia  de  que esta é uma  preferência do falante. Observemos, pois, as dicas:
Nas  locuções  verbais, o pronome  oblíquo junto  a dois verbos  pode  se posicionar:
  • antes do primeiro  verbo (desde que  os  verbos  não iniciem  oração) :  A empresa se vai desenvolver.
  • entre os  dois   verbos: A empresa vai se desenvolver. ( sem  hífen) / A empresa vai-se desenvolver (com hífen)
  • depois do segundo  verbo (desde que ele não esteja  no  particípio, pois este  pede próclise): A empresa vai desenvolver-se.  O ministro  havia  se enganado.
 Uma das  perguntas enviadas sobre colocação prononimal  dizia respeito à   forma  popular “ Vi ele“; a  leitora dizia ter aprendido  sempre que  esta  forma  é  incorreta, mas que  a  vê  tão escrita e  tão dita que  já está em  dúvida  se isto é um erro gramatical  ou não. A leitora  está   certíssima: a forma  correta  é  ” Eu o vi.” ou ” Vi-o”.  Como dito  no artigo  anterior, os pronomes  retos só podem  exercer a  função de  sujeito. Um  outro leitor indagava  se a  preposição altera a posição  do  pronome; esta  pergunta foi  também respondida  no  artigo de ontem: quando  a  preposição  aparece, ela permite que a  próclise (pronome antes do verbo) seja opcional.
Espero  ter respondido satisfatoriamente as perguntas de  todos. Se não o fiz (olha a próclise aí, forçada pelo advérbio de  negação), enviem-me  novas  mensagens, através do formulário de  contato ,  com os pontos que  não foram  esclarecidos.
E para encerrar o texto, o pensamento de  Manuel Bandeira a este respeito:
[…] Quando   eu tinha os meus treze anos e andava no  colégio  Pedro  II, vi uma  vez  Carlos de Laet aproximar-se do guichê do Jardim  Botânico e pedir com  toda  a calma: “Me dá  uma  ida-e-volta”. Foi uma revelação pra mim. Laet era  escritor  de  sabor  clássico. Se dizia naturalmente “Me dá uma  ida-e-volta”, isso  não podia ser  erro no   Brasil.  Podemos  dizer  isso  escrevendo. 


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4 Comments

  1. Sam, como eu disse no email que lhe enviei, esse seu “futuro quebrado” é comum, pois vocês escrevem direito. Um abraço!

  2. Muuuuuuuuuuuuito obrigado!

    Aqui em Portugal já perguntei a três milhões e meio de pessoas (bruta hipérbole) e ninguém me soube responder!
    Acho que já me sinto melhor. 🙂

    E, mais umas curiosidades: o futuro “quebrado”, como eu o chamo, é muito comum na escrita daqui. Por isso, ver-nos-emos em breve 😉

  3. Andréa.
    Muito bem explicado e quase assimilado rs.. o problema é decorar algumas regrinhas e tentar por em prática!

  4. Andrea muito bom. Meu português está em declínio vivendo há quase 16 anos fora do Brasil.

    Beijao e parabéns!!!

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Andréa Motta

Professora de Língua Portuguesa , Literatura e Formação do Leitor Literário no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro.

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